Painel do Mundo
Por Rafael Pena (16/07/2025)
Gol, o grande momento

Assim como no futebol de campo, no futebol de mesa, especialmente na regra 3 toques, o gol é o grande momento da partida. Há quem compare esse momento a uma grande explosão de prazer, outros como um alívio, outros como uma meta alcançada, outros como uma oportunidade de extravasar emoções. Cada um reage de uma maneira.
De forma diferente do cenário de outras regras, como a 12 toques e o Dadinho, na 3 toques é permitida a comemoração de gols, seja porque o tempo de jogo é maior (dois tempos de vinte minutos com cinco de intervalo), bem como porque fazer um gol não é algo tão simples por força, até mesmo, das imposições da regra para validação de chutes. Na 3 toques só podemos chutar a gol para a jogada iniciada no ataque ou quando decorre de falta (se a falta for na defesa basta rolar ao ataque e chutar de primeira ou dando passe). A construção de uma jogada de chute é algo próximo à jogada de xadrez para a preparação do xeque-mate. Não ocorre a toda hora. Fica um jogo de lançar para o ataque, procurar impedir que a defesa lance para o campo adversário num jogo de muito estudo mas de muita estratégia. Daí, em relação às regras 12 Toques e Dadinho, os números de gols não são tão altos. Basta ver os placares de jogos que se aproximam muito àqueles do futebol de campo.
Como o gol é algo que tem que ser muito valorizado no jogo (até porque, muito embora não conste expressamente do livro de regras da 3 Toques, quem faz mais gols ganha o jogo — isso é algo, por mais óbvio que seja, que deveria constar no livro de regras), a celebração do gol é permitida. Nas partidas e torneios da 3 Toques, não raras as vezes em que nos deparamos com comemorações dos mais diversos tipos, trejeitos e características. Algumas delas chamam muito a atenção de quem participa de jogos amistosos ou torneios da regra.
Uma das comemorações mais marcantes vem do atleta da AABB/Grêmio Mineiro de Belo Horizonte/MG, Rodrigo “Tubarugaio”. Quem nunca quase estourou um dos tímpanos ao ouvir o grito de “TIÃAAAAAAAOOOOOO”, ponta esquerda do esquadrão alvinegro do Tuba? Não bastasse a comemoração, aquele que toma um gol do Tuba carrega não só a lembrança do gol, mas também a pecha de “freguês” do Tuba, tendo vencido ou não a partida.
Outra comemoração que chama muito a atenção vem do Caraça, da cidade de Santa Bárbara/MG, do atleta Agnaldo, técnico da equipe do Guará do Caraça Futmesa. Agnaldo tem voz imponente, boa oratória, que vem lá dos tempos de docência em paralelo aos programas de rádio que narrava na região. Agnaldo incorpora mesmo a veia do rádio quando faz gols e é uma verdadeira festa. O juiz que se prepare para dar acréscimos ao jogo, pois em pelo menos 20 segundos de narração o mesmo canta, dança e detalha lance a lance do gol, fazendo o finado narrador Sílvio Luiz dar belas gargalhadas lá de cima com seus jargões.
Cada um põe para fora sua loucura na hora do gol, mas a comemoração de Renato Tull, de Teresópolis/RJ, uivando para uma lua imaginária como se fosse o gatilho para a transformação de um mero botonista para um lobisomem, também chama muito a atenção. Teve vez que presenciei um atleta meio que marcar o goleiro com desdém, quase pedindo o gol do adversário, só para ver como o Renato Tull comemorava uivando.
Marcus Motta, atleta do Tupi de Juiz de Fora/MG, tantas vezes campeão nacional individual e de equipes, várias vezes campeão mineiro individual e de equipes, por exemplo, tem uma comemoração simples, mas muito característica. Em tom quase inaudível a princípio, quando ele faz um gol, o mesmo anuncia de forma simples: “gol do Tupi”. Se estivermos num salão, num ginásio, ainda que haja conversas paralelas, som externo, música vindo da vizinhança, posso garantir que todos ouvem e sabem do gol do atleta carijó.
Uma comemoração que me chamou bastante atenção foi durante a Copa do Brasil de Equipes de 2009. Um atleta da equipe do Rio Branco de São Paulo — de quem não vou dizer o nome para preservar o grande amigo, mas quem esteve lá sabe quem é — ficou o campeonato inteiro reclamando de dores nas costas, que estava ali só para completar a equipe, pois em breve iria passar por perícia de afastamento junto ao INSS, foi escalado para jogar uma das partidas da final. A equipe paulista, em determinado momento, virou o jogo contra o Tupi/JF e esse atleta, que reclamava das costas, ao fazer um gol que ajudou a colocar a equipe do Rio Branco próxima ao título, virando o jogo, correu por toda a sala do Mineirinho e deu um pulo batendo o pé a quase dois metros de altura numa pilastra. A comemoração chamou a atenção pelo “milagre” que um gol gerou, possibilitando uma celebração que, ao final, ajudou a culminar no grito de “é campeão”. Um gol é capaz de muita coisa e a comemoração deste foi do milagre ao riso dos presentes no final.
Cada um pode e deve comemorar o momento máximo do jogo, que é o gol, mas há que se ter em mente que a comemoração não deve ultrapassar o limite do respeito para com o adversário. Assim como no vôlei, por exemplo, onde os atletas que marcam o ponto não comemoram virados para a equipe adversária, em respeito a estes, os atletas da 3 Toques também primam pelo bom senso e até mesmo pela empatia. Comemorar um gol não pode ser usado como algo para atiçar o adversário ou mesmo desrespeitá-lo. Celebrar o gol deve ser usado apenas para festejar o fato de se ter alcançado algo sublime no jogo de futebol de mesa e como elemento para gerar boas lembranças. Que assim continue e que outras comemorações de gols ocorram para a gente poder carregar na lembrança.
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Mineiro de Belzonte (Belo Horizonte para quem é de fora) Rafa Pena também é advogado, fotógrafo, pai, filho, cruzeirense de arquibancada (mas que se dá bem até com os atleticanos tanto é que se casou com uma), escoteiro, zoeiro (gosta de uma piada e uma troça), videomaker, fusqueiro e Kombeiro, participa de canais do YouTube que falam de futebol e do Cruzeiro, fã de Chaves e Star Wars, e mais um monte de coisa que ajuda a tornar a vida mais prazerosa. Joga botão desde o “estrelão” e por isso, quando conheceu a Regra 3 toques em dezembro de 2008 e teve que batizar seu time já lançou “Estrelão da Madrugada”, homenagem à sua origem e ao Seu Madruga. Procura jogar, se divertir e manter a história e a chama do botonismo aonde passa. Mais que isso, só chamando para prosear (se tiver café e pão de queijo, melhor ainda).
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